segunda-feira, agosto 20, 2012

Arqueologia

Nascer, crescer, envelhecer e morrer. Estava quase completando esse ciclo quando memórias de tempos áureos não paravam de caminhar de um lado para o outro em sua mente e em seus sonhos. Lembrava dos tempos de arqueologia quando costumava encontrar muitas coisas curiosas e outras nem tanto. Entre essas tais coisas, havia uma que nunca saiu de sua cabeça. Estava caminhando no meio de uma terra seca com um clima de deserto, mesmo havendo vegetação na área. Sabia que iria encontrar alguma coisa ali, mas não imaginou que fosse algo que seria tão marcante. Ia caminhando no meio daquela aridez e da vegetação rasteira. Avistou o asfalto e percebeu que estava chegando perto. Mas, chegando perto do que? Pegou o binóculo de dentro da mochila e percebeu algo no horizonte, uma espécie de construção. Foi chegando mais perto e percebeu um prédio caindo aos pedaços, olhou para cima, contou o número de andares e aí estava um problema dentre muitos de suas memórias errantes. Não conseguia lembrar o número exato de andares que tinha aquele prédio nem o material de que era feito. O arqueólogo apenas adentrou os domínios daquela construção.

Aquele pobre idoso era taxado de louco por seus filhos, por dizer coisas absurdas sobre os tempos de arqueólogo que não faziam sentido algum. Coisas como ter visto espíritos nas construções que visitava, ou por insistir que conseguia ver o futuro das pessoas que olhava. Um dom? Ou apenas um quadro estranho de esquizofrenia? Alguns achavam isso, outros achavam aquilo. O certo é que nada havia de certo sobre aquele velho, não importava o que afirmavam os médicos, ou os antigos colegas de profissão, sempre houve e sempre haverá essa dúvida sobre aquele indivíduo.

Aquela construção era realmente apaixonante. Era, razoavelmente, alta e com um grande terreno plano ao seu redor. O arqueólogo invadiu o terreno daquela imponente beleza e avistou no centro algo que parecia ser um banco.  Estava cansado da jornada que fez para chegar até ali, logo, caminhou rumo ao assento e acomodou-se. Tirou uma garrafa de água da mochila, molhou a garganta e começou a olhar ao seu redor. Percebendo o grande espaço que tinha por ali, começou a imaginar o que acontecia lá quando pessoas ainda moravam por ali. Fechou os olhos e os manteve assim por um considerável período de tempo. Sentiu a brisa que passava por ali e o sol batendo em sua pele, até decidir abrir os olhos e ter a visão de como aquele lugar era nos tempos de habitação.

O pobre velho tinha sido jogado em um asilo pelos filhos. Suas histórias e contos não os interessavam mais. Achavam que era tudo uma grande besteira e que sua loucura poderia contagiar os netos. Enfim, nunca pararam para prestar atenção no que aquele pobre tinha para dizer, apenas se livraram dele da maneira mais fácil e conveniente que acharam. Tiraram dele as coisas que ele mais dava valor: a falta de rotina que sempre fez parte de sua vida e a boa conversa que sempre teve com seus antigos colegas sobre as descobertas e aventuras que tiveram juntos.

O arqueólogo conseguia ver claramente todos os espíritos de todas as pessoas que habitaram aquele local em uma determinada época. Ficou fascinado com a simplicidade e a felicidade de quase todos por ali. Procurava algo ali que pudesse ter um significado maior do que tudo que já tinha conseguido. Procurou e nada achou. Depois de um curto período de tempo, percebeu que um dos espíritos o encarava de uma maneira completamente fora do normal, afinal, eles não estavam realmente naquele lugar, eram nada mais nada menos que visões. Aquele espírito tinha a aparência de uma garotinha, e o olhava como se suspeitasse de alguma coisa, era inacreditável o que estava acontecendo.

No asilo, as visitas eram raras e tinha de se contentar com a solidão. Não gostava nenhum pouco daquele lugar, mas aquele lugar gostava muito dele. Muitos dos ali presentes gostavam de escutar suas histórias e aventuras. Porém, ele não ligava para aquilo, tudo que queria era rever os netos e deixar de ser taxado de louco pelos próprios filhos, aqueles mesmos que ele alimentou e educou durante longos anos. Achava inaceitável que fosse odiado pelos filhos que tanto amou e amado por pessoas que ele nunca tinha visto antes. Esquecido, era assim que se sentia.

Estava fascinado pela garotinha que o encarava, olhava fixamente para os olhos dela como se tentasse ver o que aconteceu com ela naquele lugar em um diferente tempo. Era uma tentativa inútil, não conseguia ver nada, apenas a olhava e nada além disso. Quem seria capaz de fazer alguma outra coisa? Uma pena que sua idade não permitia que lembrasse de muitos detalhes sobre aquela pequena garota. Momentos depois, a menina apontou o dedo para o seu rosto e começou a chamar os outros espíritos que os cercavam. Estes começaram a observar a ação da menina por um certo tempo até que todos voltaram a fazer o que faziam e deixando de lado a pequena criança . Alguém que parecia ser a mãe da menina chegou e começou a puxá-la pelo braço como quem diz que já estava na hora de ir pra casa.

Meses se passaram naquele maldito asilo e fez um punhado de amigos por lá, mas, mesmo assim, continuava a detestar o lugar e, por sua vez, o lugar continuava a amá-lo. Aquele ambiente apenas representava a exclusão pro pobre idoso, o esquecimento e a desgraça da rotina que nunca o assombrou, mas o fez nesses últimos meses. Era tedioso, era chato, era tudo que não gostava. As visitas de seus filhos e netos continuavam cada vez mais raras e isso era o que mais lamentava. Não conseguia entender o motivo de tamanha indiferença por parte deles. Sempre foi muito atencioso e presente e fazem tudo isso por acharem que era um louco? Era uma grande injustiça e achava que um dia poderia entender aquilo.

Assistiu a menininha partir com sua suposta mãe com lágrimas nos olhos. Não era pra menos, nunca havia visto nada que chegasse perto da magnitude daquilo em nenhuma de suas viagens. A garotinha olhou para trás e tirou o gorro vermelho que usava e o jogou no chão enquanto mantinha contato visual com o arqueólogo. O aventureiro decidiu fechar os olhos de novo por um razoável período de tempo e depois que os abriu não via mais aqueles espíritos. Caminhou até o lugar onde, supostamente aquele misterioso espírito havia deixado o gorro cair e começou a cavar. Depois de um longo tempo, não encontrou aquele gorro vermelho e sim um pedaço de tecido vermelho. Decidiu sair dali logo em seguida para poder voltar para casa e guardar o mais novo e, por que não dizer, mais precioso de todos os bens que já havia adquirido em uma expedição. Realizou a viagem de volta para casa e colocou aquele velho pedaço de tecido em uma maleta.

Mais alguns meses se passaram no asilo e, com essas lembranças povoando seu cérebro, não parava de pensar naquela menininha que o encarou há muito tempo e no velho pedaço de tecido que guardava. Foi até sua maleta e deu uma olhada naquele tecido, o que provava que de louco ele pouco tinha. E sobre aquela garotinha, continuava pensando o que havia acontecido com ela, o que ela se tornou, o que gostava de fazer, e sobre a vida como era a vida em família daquela fascinante criança. O que seria ela? Será que tinha algum dom parecido com o do velho arqueólogo? Mas como ela podia ver que alguém estaria ali e poderia vê-la depois de tanto tempo? O pobre idoso estava sofrendo com aquilo, não só com aquilo, mas também com uma grave doença. Sabia que a morte estava próxima e que não demoraria muito para partir.

Não pensava em nada, apenas na garotinha, quando, de repente, todos os seus filhos e netos apareceram. Todos sabiam que o idoso estava morrendo e que não demoraria muito para que acontecesse. Conversaram por um longo tempo. Os filhos todos sabiam que não poderiam mais vê-lo em breve, os netos eram muito novos pra entender que não veriam mais o avô em pouco tempo. A conversa seguia até que o velho arqueólogo chamou o mais velho dos filhos para perto e susurrou em seu ouvido toda a história sobre aquela pequena menina.

- Filho, te diria onde minha maleta está, mas não consigo lembrar onde a coloquei. Procure-a e se pergunte novamente se sou louco. - Finalizou o arqueólogo.

Nunca havia levado as histórias de seu pai a sério, mas por ser o último desejo dele, prometeu que iria em busca da maleta, e torceria para que estivesse errado quanto ao julgamento que sempre teve de seu próprio pai.

Nascer, crescer, envelhecer e morrer. É o ciclo natural de todas as coisas que existem nesse doce planeta Terra. O velho decidiu fechar os olhos pela última vez por um considerável período de tempo.

- Envelheceu e me deve muitas respostas. - Sim, esse foi o último pensamento daquele velho enquanto encarava alguem que ninguém mais conseguia ver ou sentir.

Passou seus ultimos minutos assim, pensando em que perguntas poderia fazer. Pensou e pensou...
até que as lágrimas predominaram em toda a sala. Seu ciclo estava completo.

...

sexta-feira, julho 13, 2012

Dia


Era um dia daqueles que os olhos não parecem olhos, estão mais para algum tipo de nascente. Era um dia que se percebia o quão apaixonado está o Sol pela Lua. Um dia que os pássaros cantavam uma melodia não muito comum que fortalecia lembranças. Não era um dia bonito, não era feio, era estranho, esquisito, assim, incomum mesmo. Bom, ruim, sabe-se lá o que achar de dias assim. Noites...

E com a pouca luz que o Sol mandava, percebiam-se estrelas em todo o céu. E as tais estrelas lembravam olhares que há tempo não são vistos. Não estava claro, não estava escuro, luminosidade suficiente para apreciar constelações, observar vaga-lumes e lembrar de coisas que já foram/são importantes. Não era necessário muito, apenas, caíam as pálpebras e os olhos se fechavam. Tudo calmo agora.

Agora, um vaga-lume, devagar vagava, divagava, voava em devaneios, chorava sem motivo e com toda a razão. A vaga que mais quis se foi, pode voltar, mas não sabe onde guardou a fé nisso. Não seca os olhos, sabe que não adianta, ficarão molhados novamente. Não segura as lágrimas, queria pode ignorar tudo com os outros fazem, não consegue, tem o coração sensível demais, encontra-se aos prantos com alguma frequência. Julgava-se forte, e percebe que sempre esteve enganado.

Madrugadas, voltaram a ser solitárias, ainda está se reacostumando a isso. Voltou a olhar o céu e jogar palavras no papel. Voltaram as histórias tristes de outros tempos, sua origem, sua inspiração. Tornou-se novamente aquele homem solitário da noite, inspirado por histórias diferentes. Assobia e não obtem resposta, assobia e lembra das pequenas frutas, assobia, abre os olhos e nao consegue ver nada.

Alimentou-se de ilusões, acreditou que conseguiria, e hoje alimenta-se de esperanças pequenas, tem fé em coisas improváveis. É uma pequena luz apaixonada por uma luz ofuscante, um vaga-lume apaixonado pelo Sol. E tudo que esse vaga-lume quer é virar Lua e deixar o platonismo de lado. Assim, desejo-lhe uma boa sorte.

segunda-feira, junho 18, 2012

Infinito

Dentre as incompreensões humanas, podemos falar do infinito. Sabe-se que é algo muito grande, mas quão grande seria o tal? Não se sabe, não há como saber. O infinito cresce junto com a imaginação, não havendo limites para esta, o limite daquele também se torna impossível. Poderia falar mais, contudo, não vejo razões para debater a incompreensão. Porém, quem sou eu para decidir o que debater? Eu sou apenas uma criança que teve suas definições sobre algumas coisas alteradas completamente de um tempo pra cá. Achei que sabia o que era a felicidade, mas nunca na minha vida me senti tão feliz quanto quando estou ao seu lado, pensei conhecer a saudade e notei que nunca soube o que era saudade até ficar algumas horas sem poder ouvir sua voz, algumas horas sem poder olhar diretamente em seus olhos, enfim, alguns míseros minutos depois que se ausentasse. Você não seria capaz de entender o que eu sinto, eu queria que pudesse, mas não pode. Com você longe, a saudade é descomunal, algo que não consigo explicar. Agora, estar perto de você, a alegria, a felicidade, também são incompreensíveis, porque elas variam de acordo com a imaginação, elas se encaixam perfeitamente na definição de infinito.

quinta-feira, junho 14, 2012

Bagunça

É tudo uma bagunça, é tudo um tumulto e tá tudo arrumadinho. Aqui, ali e todo lugar. Arruma ali, ajeita aqui e, olhem, são pessoas arrumadas. Sorrisos lindos, fotos, sabe-se lá o que vão fazer. Batem asas rumo à diversões efêmeras, vai entender. Estão juntas, negam a natureza da solidão humana, bom ver coisas assim. Estão ajeitadas, mas seus cérebros, poluídos. Não se importe, estão belos, o que mais tem importância? Deixem-lhes semear o pseudo-amor que tomou conta de todos. Colírios e látex, pra que combinação melhor? Estão certos, porém...
Bom......
Prefiro manter-me na minha bagunça.

terça-feira, junho 12, 2012

Vaga-lumes [3]

Esquisito, não era acostumado a dividir momentos como aqueles com outras pessoas. Na verdade, não dividia nada com ninguém, não confiava em ninguém.Salvo algumas raras exceções no decorrer da vida, sentia a língua presa ao falar com outros humanos, não conseguia, não saía uma palavra sequer da sua boca. E agora, há uma estranha ao seu lado e... ela gosta de vaga-lumes? Era uma bela estranha, ou pelo menos parecia ser. Era uma situação d..
- O que fazes aqui a essa hora?
- Não sei ao certo, alguma coisa me atormenta, não consigo dormir, decidi vir aqui como faço em situações assim.
- Menino, és estranho.
- Estranho... todos somos um pouco.
- Verdade. E o que te incomodas a ponto de tirar-te o sono?
- Não sei. Padeço por coisas que não acontecem, que poderiam ter acontecido.
- Sofres por antecipação, isso está errado.
- Talvez esteja, mas criar expectativas sobre certas coisas é inevitável.
- Estás certo mais uma vez.
- E tu, que fazes aqui?
- Queria ver esses pequenos insetos. São minha paixão
- São belos, não julgam, te ajudam. Fazes bem ao amá-los.
.
.
.

- Menino, gostei de ti. Está tarde, devo ir. Amanhã te vejo aqui?
- . . .

...

sábado, junho 09, 2012

Vaga-lumes [2]

- Meus amiguinhos, há muito não nos falamos, estava ocupado a sonhar aquelas coisas que nunca se realizarão. Lembrava do brilho de vocês todos os dias, sempre querendo vir falar. Cansei-me das pessoas, elas tem um julgamento errado sobre muitas coisas. Queria poder voar e iluminar um pouquinho a noite como fazem. Não sei exatamente o que fazer agora, estou perdido nesse mundo louco, costumam falar que não me encaixo na história, sou antiquado. Bom, ja comentei disso com vocês algumas vezes, devem estar cansados de ouvir isso. Falemos de outras coisas e...
Seguiria o raciocínio, mas ouviu alguns passos que pareciam ir na direção de onde estava.
- Quem está aí?
- Apenas uma apaixonada por pequenas luzes, apaixonada por esses pequenos vaga-lumes. Me chamo...
- Poupe-me do nome, eles não são importantes.
Eram dois apaixonados por pequenas coisas ali, iam àquele campo com uma frequência razoável e nunca haviam se falado. Seguiam mudos, observando os insetos, sem saberem os nomes um do outro, afinal, eles não eram importantes. Queria acreditar nisso...

quinta-feira, junho 07, 2012

Vaga-lumes [1]

Há muito tempo, numa pequena vila, existiam várias histórias sobre vilões, heróis, pessoas boas, pessoas ruins, muitos mitos e algumas verdades. E era nessa vila que morava um garoto, um daqueles que não se encaixam bem na história. Não era gordo, não era magro, não era bonito, não era feio, não era alto nem baixo, não era nada. Acostumou-se a ser gentil com todas as pessoas, mesmo as mais horríveis, embora não ligasse muito para elas. Chorava às vezes, era bem sensível, lacrimejava por coisas estúpidas, histórias tristes e cantos depressivos. Era apaixonado por coisas pequenas, vaga-lumes e sonhos, coisas assim. Sonhos, sua mente era infestada deles, uma praga, pois nunca achava que iria realizar um deles sequer. Tinha muitos princípios, seguia à risca todos eles, por isso, muitos o julgavam estúpido, apenas por acharem que ele se prendia a coisas que não pertenciam mais ao tempo que viviam. Era idiota, estúpido, taxado assim apenas por ser bondoso. Quais sonhos realizar assim?

sexta-feira, junho 01, 2012

Olhos Fechados

Lá vem a chuva, no mesmo horário de sempre, encher as ruas de lágrimas e lotar muitas cabeças de dúvidas. Sob chuva, sob neve, enfim, não importava muito desde que estivesse ali. Continua dormindo e eu pensando o que povoa seus sonhos que possa trazer sua alegria, o que existe em seus pesadelos para que se assuste tanto. Olhos fechados, belos sonhos, e tudo que há como desejo resume-se a um beijo. Seguir em frente e logo parar, nao pode acordar, controlar as vontades... "O que há?" Então vamos voltar e ter mais do que queremos. E as lágrimas seguem caindo na rua e todas essas coisas na minha cabeça. Olhos fechados... Consegue sentir a distância? Ja sentiu a distância? Poderemos seguir juntos? Continua dormindo e meu coração se partindo... Um amor em vão forte assim? Ouça o barulho... um outro rio salgado. Tentar passar do limite agora? Justo agora? Essa tempestade limpa meus medos, apenas ouça. Talvez esteja sendo duro demais, peço perdão por isso. Estou melhorando por você, quem sabe um dia poderemos caminhar juntos por aí, de mãos dadas, como o amor pressupõe. Olhos fechados, belos sonhos, belas lembranças... E o desejo é de apenas um beijo...

terça-feira, maio 15, 2012

O Soldado Solitário [3]

Segue sem sabedoria, sumindo, sem direção. Os olhos já estão feridos, o cheiro de pólvora de outros tempos voltou a ser percebido. Os gritos de suas vítimas, mais uma vez, ecoam em sua cabeça, e tudo isso apenas por fazer o que queriam que fizessem. Seu anjo já está descrente em sua volta para casa, e nada mais certo, para aquele velho, seu lar já não existia mais. Queria encontrar alguma coisa ali, mesmo com o pleno conhecimento que isso não estava lá.

Depois de todo esse tempo, decidiu prestar atenção a si mesmo, sua carne não era a mesma, sua mente estava completamente diferente, efeitos da total solidão que encontrava naquele purgatório. Purgatório? Então... Era uma possibilidade, como alguém com tanto podia simplesmente ignorar toda a vida que o cercava? Um lar, uma família, podia um vivo ser tão indiferente a isso? E todas essas ilusões? Parte de algum castigo? Os gritos, as vozes, o caminho sem fim, o tesouro que não existe, seria isso? Não, ele não queria acreditar nisso.

"O que estou fazendo aqui exatamente? Não há motivo pra isso, por que ser tão teimoso?"

- E agora é tarde demais.

- O que?

- Já definiu suas escolhas, não pode simplesmente voltar atrás e refazer sua vida. Aceite as consequências.

- Não posso simplesmente ser passivo a isso, quem você pensa que é?

- O responsável por toda a sua confusão e toda a sua estupidez.

E com a consciência de que estava condenado, decidiu apenas se entregar, não havia nada que pudesse dar esperança àquele velho soldado, sua família era passado agora, vão se acostumar a isso. Seus filhos, crescerão sem lembranças do pai. E sobre seu Anjo... Tentava seguir sua voz, no meio de todas aquelas que ecoavam em sua cabeça, sabendo, com total certeza, que deixaria de existir, assim como anjos e milagres deixaram de existir.


domingo, março 25, 2012

O Soldado Solitário [2]

Vamos, continua não sendo estranho. É o mesmo cenário, mas, desta vez, não há as corriqueiras explosões de tempos atrás. Vá soldado, as coisas que tinham de ser feitas por aqui ja terminaram, volte pra casa, volte pras asas do seu anjo. Você sabe muito bem que ela te aguarda ansiosamente apenas para poder tocar seus lábios novamente, sussurar mais uma vez no seu ouvido, poder te falar de novo como foi o dia e os planos para o dia seguinte. Vá, sequer sabe o que está procurando por essas terras abandonadas, volte para seu lar, seja feliz novamente.

Ainda existe um caminho a percorrer, não podia simplesmente abandoná-lo na metade. Está com medo do que pode vir a seguir e, mesmo assim, segue rumo ao desconhecido daquele velho palco.Vai vagando em vão, como vermes e vilões, vil e voraz. Segue sensível e sensato, atento às vicissitudes da vida, sabendo sem saber se seu cérebro segue são ou se enlouqueceu. Solitário, sozinho e sonolento, passo a passo, segue seguindo.

Todas essa ilusões estão deixando o pobre soldado louco e ele não tem ajuda. "Vamos, vamos, quem sempre me ajudava nessas horas?":

- Por que toda essa demora? Um lar te espera.

- O que? Quem? Não pode...

- Desista disso, você sabe que por mais que caminhe, jamais chegará aonde quer.

- E quem seria você para me dizer o que fazer? Apenas mais uma dessas todas.

- Acredite no que quiser, apenas quero seu bem e sei que estaria muito melhor aqui.

- Mas como? Essa voz, não dá...

- Deixe de negar os fatos. Você sabe, eu sei que sabe. Por que lutar tanto contra?

- Apenas me deixe pensar, nao estou certo quanto a nada.

- Siga suas vontades, esqueça todo o resto.

Anjo, lindo anjo, não pode eliminar todas as dúvidas existentes na cabeça desse pobre louco. Sozinho, assim é melhor para ele agora, tente ignorar. Já percebeu que ele não dará ouvidos a ninguém. Apenas se preocupe e o ame desse jeito. Mesmo sem perceber, ele se sentirá melhor assim...

quarta-feira, março 21, 2012

O Soldado Solitário [1]

Não era estranho, nada incomum, era apenas um soldado solitário no antigo cenário onde se acostumou a matar centenas de pessoas. O mesmo palco antigo, a mesma neblina de sempre. Não era perto de nada, um lugar de dar medo nos desinformados. Soldado solitário, qual é o motivo de estar ressucitando as velhas lembranças dos tempos de guerra? Corpos no chão, sangue por todo lugar, pra que fazer isso ficar tão vivo na mente de novo? Vá velho combatente, volte pra casa, esse não é mais seu lugar, mesmo que carregue o seu velho e companheiro revolver consigo, não há mais ninguém aqui possa ser chamado de ameaça. Então, apenas esqueça isso, você sabe que tem um anjo em casa te esperando, apenas siga a voz que te chama.

Não, não é isso que ele quer, prefere continuar vagando pela planície que já fora preenchida por montanhas de corpos humanos devido ao horror de outros tempos. De alguma forma, aquilo o fazia feliz, lembrava dos tempos em que sua agilidade, seu reflexo e sua habilidade com as armas de fogo eram surreais. Lembrava de cada pessoa que matou ali, e a cada nova lembrança, um novo sorriso tímido se abria. Não se sentia bem por ter tido o destino de matar todas aquelas pessoas, mas era isso ou a própria morte. Sentia o peso de todos as pessoas que matou nas costas, um grande peso na consciência de um pobre homem que só seguia ordens naquele tempo.

Voltar para seu lar, sim ele queria, afinal, tem pessoas que o esperam por lá, um anjo, desses que não tem asas. Seguia perambulando por aquela paisagem, revivendo lembranças e pensando nos seus entes queridos, criava diálogos em meio a solidão daquele lugar para que não enlouquecesse por ali mesmo, muito embora, as vezes, pensasse que ja estava começando. Ouvia vozes provenientes do céu, de algum anjo, quem sabe? Ouvia, mas não prestava muita atenção, alucinações nao poderiam atrapalhá-lo agora. "Você não sabe que eu te amo? Você nao sabe que eu sempre o fiz? Por que não voltar logo." O que diabos? Não, essa distração não pode tirar o foco que ele tem.

"Senhor, pode me ouvir agora? Pode fazê-los parar com isso?" Como podia se atrever a isso? Não pode simplesmente fazer isso. E junto com todas essas vozes e diálogos loucos, seguiam as alucinações, pessoas que havia tirado a vida, pessoas que nunca tinha visto, pessoas amadas e corações partidos. "Você não tem muito tempo." Achava ter perdido seu anjo por pura besteira, essa esquizofrenia louca. Esse pessimismo todo, sempre o acompanhou mas agora o faz como nunca. Como poderia aquebe belo anjo fazer isso? Nao podia permitir que aquilo continuasse. E o que pode fazer? Seus olhos nao conseguem ver nada em que possa atirar. Aquela neblina toda atrapalhava demais.

Não sabe muito bem que alternativas tem, está perdido no meio daquela densa atmosfera. O coração preenchido por incertezas, o pensamento completamente voltado ao anjo não alado que o espera e, ao seu redor, muitos dos espíritos que lembram seu tenebroso passado. Lembrava de todas as suas cicatrizes e de como feriu pessoas de maneira irreversível. "Vamos lá, deixe disso, você sabe que eu te amo, então, volte logo pra mim, venha ficar ao meu lado." Como conseguia ignorar isso? Anjo, belo anjo, apenas siga esperando, a volta está próxima. Seguia caminhando, olhando para o céu e tentando adivinhar seu futuro...

terça-feira, março 20, 2012

Preocupações

- Sim, estou com medo

- Medo de que se a certeza é tão grande?

- Não sei ao certo, apenas me sentindo um pouco desconfortável.

- Não há motivos para preocupações, você bem sabe.

- Como não? Entender a cabeça das pessoas está longe de ser algo palpável ao saber.

- Talvez, mas com tantas demonstrações, acha realmente que preocupações são plausíveis?

- Sempre serão, evitam que tomemos tombos muito grandes.

- Ainda não consigo compreender... Se a preocupação é tão grande, porque fazer isso tão cedo?

- Apenas pelo fato de não conseguir esperar muito mais. Todas as fibras que me compõem estão pedindo
para que seja feito logo.

- Então, apenas ignore todos esses pensamentos, e vá em frente, isso pode te impedir de fazer o que realmente quer.

- Sim, eu tento fazer isso. Enfim, coisas malucas que acontecem com a cabeça de todo mundo.

- É, você está certo.

- Bom, que a sorte me acompanhe.

segunda-feira, março 05, 2012

Jonny [2]


- Pois é Jonny, tinha tanto tempo que não conversávamos, eu realmente to te estranhando um pouco.

- Deixa disso Léo, eu sempre serei eu, você está apenas estranhando a nova fase que estou passando.

-É isso mesmo Jonny, esse novo você me estranha bastante. Estava acostumado a te ver de um jeito 
completamente diferente do atual.

- Fases vêm e vão, aquela foi embora, essa está chegando. Apenas acostume-se.

- Isso eu faço com uma facilidade grande. Pode deixar.

- Assim espero Léo.

- Mas Jonny, ver você desse jeito, é realmente bom. Não imaginava que você teria uma personalidade tão 
diferente daquela.

- É, mas isso não é só por minha causa, alguns fatores externos ajudam bastante para que isso seja assim.

- Sim, dá pra ver.  E pensar que eu nunca imaginei que você fosse se reerguer tão rápido. Isso me deixa 
realmente feliz.

- E saber que está feliz me deixa feliz.

Um grande abraço e todas as mudanças foram percebidas, tudo que havia acontecido foi explicado. A 
grande ausência não existia mais e podíamos ser amigos como todos os amigos são, como éramos.

- Jonny, você é o amigo que todos queriam poder imaginar.

E a realidade seguia sendo exposta.

domingo, março 04, 2012

Jonny [1]

- Ei Jonny, você não acha que está agindo um pouco estranho demais?

- Que culpa tenho se não quero  controlar todos esses impulsos?

- Mas Jonny, você não devia tentar contê-los pelo menos um pouco?

- Pra que isso Léo? Deixar que tudo aconteça do jeito que tem de ser, isso faz com que eu me sinta feliz e 
não quero que nada mude.

- E desde quando você ficou desse jeito? Sempre pensou muito em todas as suas ações, tentava prever todos os resultados possíveis de tudo o que fazia, desde quando você mudou tão radicalmente?

- Desde que certas coisas aconteceram, coisas boas, coisas ruins, depende muito do ponto de vista. Pensar demais nem sempre é bom.

- Sim, eu sei.

- Então, deixe que seus instintos comandem tudo.

- Mas Jonny, isso não me parece muito certo. Isso me parece conversa de...

- E quem sabe não seja Léo?

- Jonny, não me diga que você...

E deixe que tudo flua. Sem impedimentos.